sábado, 6 de julho de 2013

A palavra é de... Geraldo Ferreira Filho

Os Médicos e o enterro do Ministro

A força da mobilização dos médicos em quase todas as capitais, mas também em muitas cidades brasileiras, mostrou claramente a insatisfação, o repúdio e a quase incompatibilidade dos profissionais com as políticas de saúde que vem sendo desenvolvidas em esferas tão variadas como cidades, estados e o governo federal.





Mas a centralização dos protestos no ministro Padilha, enterrado simbolicamente em boa parte das mobilizações, o identifica como o grande arquiteto, que em vez de políticas reais de saúde, se enreda nos labirintos de interesses partidários, ideológicos e eleitoreiros, que vem causando grande mal à gestão da saúde e podem mergulhar o que já é muito ruim na degradação total.

Na última apresentação no Senado o ministro nos deixou estupefatos, quando em audiência pública dizia ter um bilhão e meio para reformar unidades onde trabalhariam os supostos médicos importados. E para os brasileiros, ministro? Também disse que os médicos estrangeiros seriam pagos pelo governo federal. E porque não os brasileiros, ministro, já que um problema das prefeituras que não conseguem atrair profissionais são salários ridículos, que pouco superam o salário mínimo? Ah, mas há cidades que pagam até 20 mil ou mais e os médicos não querem, diz o governo. Em que condições, perguntamos nós?

A verdade é que na estratégia de saúde da família o médico já assume a função de três ou quatro, fazendo papel de clínico, pediatra, ginecologista, obstetra, e nos salários fantasiosos divulgados o médico seria também urgentista e emergencista, trabalhando sete dias por semana em regime de prontidão permanente.

Ora, tenham paciência, o médico quer trabalhar, não ser escravo do capricho de gestores. O pacote de gestão, apregoado pelo ministro, de Unidades de pronto atendimento, as Upas, Unidades de atendimento médico especializado, as Ames, financiadas pelo governo federal, tem via de regra gestão terceirizada, contrariando a constituição e abrindo portas para tráfico de influência e corrupção.

É também desse laboratório a gestação da EBSERH, Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, que administrará os hospitais universitários, ferindo a autonomia das universidades, e destruindo o regime jurídico único e a carreira pública. Os sinais de inconstitucionalidade são fartos.

O Provab, programa de valorização da atenção básica é uma exploração grosseira de recém formados, que em vez de salários e direitos trabalhistas, recebem uma bolsa e um trabalho que deveria ser feito por uma equipe de médicos, mas que segundo o governo pode ser feito por supervisão à distância.

São absurdos em cima de absurdos que se completam com a teimosia obtusa do ministro Padilha em trazer médicos do exterior, para locais de difícil provimento. Surdo às sugestões de carreira médica e salário justo, além de condições de trabalho, o governo insiste no conflito com a categoria médica, da qual o ministro é oriundo e que afronta.

Para onde estamos caminhando? Para o embate sem tréguas, para a luta mortal, onde alguém sairá derrotado? Ou o bom senso prevalecerá? De nossa parte temos como estratégia de luta a conscientização crescente da sociedade que exige saúde padrão FIFA e não as enganações propostas, a sensibilização para as questões de financiamento, carreira de estado para o médico, gestão qualificada e não aparelhada da Saúde, condições reais de trabalho para a boa assistência.

A revolta dos médicos, longe de ser meramente corporativa, à semelhança das manifestações de rua, que passam longe de serem por 20 centavos de uma passagem de ônibus, se reveste do sentimento arraigado, do desejo de que as coisas melhorem, que a saúde funcione, a gestão seja eficiente, o financiamento adequado, que a corrupção seja afastada e os corruptos punidos, neste sistema em que campeiam denúncias de malversação de recursos públicos.

Os médicos nunca foram omissos, denúncias à sociedade, ao ministério público, até a Delegacias de polícia se sucederam em todo Brasil, ao longo desse processo de sucateamento e degradação da assistência à saúde. Sempre achamos que um dia a maior vítima desse sistema perverso acordaria, e não é que o povo brasileiro acordou!

E me utilizando de Nelson Rodrigues, digo o óbvio ululante, uma pátria não pode fazer com seus filhos o que anda fazendo o Brasil com os que procuram assistência no sistema único de saúde brasileiro. O ministro da Saúde tem assumido posições que confrontam o que a categoria médica, até por estar na linha de frente do atendimento, entende como modelo de uma assistência de qualidade, humanitária e eficiente.

Por isso o ministro paga um preço, por isso foi enterrado em tantas manifestações pelo Brasil afora.


Dr. Geraldo Ferreira é médico e Presidente da Federação Nacional dos Médicos (FENAM).

Do site Brickmann & Associados

4 comentários:


  1. Acabo de ver um cartaz lá no Facebook:

    "Maquiagem da Dilma: R$ 3.000,00
    Cesariana paga pelo SUS: R$ 150,00"

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  2. Sabe de uma coisa? O plebiscito na capa de VEJA de hoje é o único que eu gostaria de responder. MH

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  3. o que está acontecendo? procuro uma resposta. O país está naufragando. Prefiro não acreditar e nem quero. Mas hoje li o texto do Lara Resende que vai ser lido na FLIP. Me assustei. Até que enfim a voz e a escrita do saber apareceu. Recomendo. O que tenho visto por ai me assustam mas não me comovem. O Bloch de hoje no Globo merece uma leitura.
    Ou então vou correndo pra minha vitrola e colocar o Gonzaguinha cantando...eu acredito é na rapaziada....

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  4. Paulinho, não li nada disso. Vou ler já, já. Uma recomendação sua é lei! E vou escrever para você. Um beijo,
    MH

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