quinta-feira, 11 de julho de 2013

Palavra da Coruja


Mesmo quando em plena agonia, não perca jamais a esperança, pois 

o tutano mais delicioso está dentro do osso mais duro. 

Hafiz

(poeta persa do século 14)

Fim de Tarde


                                  The Best Is Yet to Come

Para a Hora do Chá


Cogito

eu sou como eu sou
pronome
pessoal intransferível
do homem que iniciei
na medida do impossível

eu sou como eu sou
agora
sem grandes segredos dantes
sem novos secretos dentes
nesta hora

eu sou como eu sou
presente
desferrolhado indecente
feito um pedaço de mim

eu sou como eu sou
vidente
e vivo tranqüilamente
todas as horas do fim.

Torquato Neto

A palavra é de... Carlos Brickmann

Pagando favores

Não faz muito tempo, descobriu-se que o deputado federal Henrique Eduardo Alves, presidente da Câmara, usava parte da verba de seu mandato para comprar reportagens pagas num jornal de seu Estado, o Rio Grande do Norte. Escândalo? Imagine! O escândalo é bem pior: o jornal que publica as reportagens pagas pelo deputado, elogiando o deputado, é de propriedade dele mesmo, o deputado.

O senador Jader Barbalho é dono de um forte grupo de comunicações, mas gasta bom dinheiro da verba de seu mandato em divulgação - como se os veículos que a ele pertencem, o jornal Diário do Pará, o Grupo RBA de Comunicação e a TV Tapajós, filiada à Rede Globo, não o promovessem o suficiente.

O ministro da Integração, Fernando Bezerra, levou a Brasília, por conta do Tesouro, nove blogueiros de Estados nordestinos - tudo pago, passagens, hospedagens, refeições, passeios pela cidade. Aceitará em troca notícias que não sejam favoráveis? Ou que, no futuro, critiquem obras do Ministério no Nordeste?

Mas estas são iniciativas individuais. Há também projetos específicos de injeção de publicidade estatal em veículos que, talvez por coincidência, se coloquem com ênfase a favor do Governo. Para este colunista, o fenômeno provavelmente é inevitável: se o Governo puder gastar em publicidade não-institucional, é muito difícil que encaminhe o maior volume de seu dinheiro para veículos que não o apoiem, mesmo que tecnicamente a mereçam. O erro está na existência de publicidade pública maciça (os anúncios oficiais deveriam limitar-se à promoção de informações essenciais, como campanhas de vacinação, etc.) Não há justificativa para pagar por publicidade de empresas estatais não-competitivas, como a Sabesp em São Paulo (única fornecedora de água, única coletora de esgotos), ou do BNDES nacional.


De qualquer forma, é interessante verificar como é distribuída a verba estatal de publicidade (as informações disponíveis são apenas federais; mas o dinheiro estadual é investido em propaganda da mesma maneira distorcida). As informações sobre verbas federais foram fornecidas pela ministra Helena Chagas.
1 - O site Carta Maior, com 9,7 milhões de visitas em 2012, recebeu R$ 830 mil de publicidade federal no período. Mais que a versão eletrônica da Folha ,com 311 milhões de visitas, que recebeu R$ 780 mil; e que a Abril.com, que recebeu três bilhões de visitas e verba de R$ 586 mil.
2 - O portal Terra é o sétimo em audiência e o primeiro em anúncios federais. 
3 - O Facebook tem 48 vezes a audiência do R7, ligado à Rede Record, mas recebe menos publicidade do Governo Federal.
Clicando aqui, um balanço da distribuição das verbas publicitárias federais, mostrando que o pessoal a favor recebe mais, independentemente da audiência.

Publicado originalmente no Observatório da Imprensa, 9/7/2013

O Velho Graça e o cinema, por Luiz Zanin

                                       Cena de "Vidas Secas", de Nelson Pereira dos Santos


Outro dia, comentando as três obras de Graciliano Ramos adaptadas (Vidas Secas, Memórias do Cárcere e São Bernardo), disse algo sobre a relação do escritor com o cinema.

Na verdade, baseava-me na implicância do seu personagem Luis da Silva, em Angústia. Moralista, Luis comenta com seu vizinho, Ramalho, que o cinema é uma pouca vergonha. Que os casais saem de lá “esquentados” com o que veem na tela. Recomenda ainda a Ramalho que, podendo, ficasse longe das salas de projeção. Aquilo é o inferno, insiste.

Bom, mas essa é a opinião do personagem. E já estamos grandinhos para confundir opinião de personagem com a do autor, não? Na verdade, nunca tinha lido coisa alguma do próprio Graciliano falando em cinema.

Acontece que, motivado pela homenagem da Flip, comecei a ler, com imenso atraso, a biografia de Graciliano escrita pelo Dênis de Morais (O Velho Graça, José Olympio, 1992, 2ª edição). Soube que Dênis esteve em Paraty, falando de Graciliano, claro, mas não acompanhei todo o noticiário. É coisa demais, pois, para a imprensa brasileira a Flip é o terceiro maior evento em importância mundial, perdendo, talvez, para a Copa do Mundo e a Olimpíada. É que lemos muito aqui neste país, sabe?

Mas, enfim, lendo o Dênis, encontro a citação de uma crônica de 1915: “O cinema! Ah! O cinema é uma grande coisa! É quase como o amor – é decantado e posto em prática por toda a gente. (…)Aquilo é delicioso. Eu adoro o cinema. (….) Decididamente, eu sou doido pelo cinema. Todo mundo é assim, todo mundo gosta de cinema. E se alguém o censurar, o vilipendiar em vossa presença, podeis afirmar convictamente que esse alguém é um despeitado.”

Despeitado, talvez, como Luis da Silva, seu neurótico personagem. Quer dizer então que o Velho Graça era louco por cinema, como quase todo mundo. Pelo menos o seu amor foi correspondido, pois o cinema o tratou muito bem até agora. Vidas Secas e Memórias do Cárcere, de Nelson Pereira dos Santos, e São Bernardo, de Leon Hirszman, são três obras-primas.


Transcrito do Estadão.com.br, de 10/7/2013

Arca do Tesouro

Santa Piadinha

Quatro mães católicas estão tomando um chá. A primeira mãe, querendo impressionar as outras diz:

- Meu filho é padre. Quando ele entra em qualquer lugar todos se levantam e dizem: "Boa tarde, Padre!"

A segunda mãe não fica atrás e comenta: - Pois meu filho é bispo. Quando ele entra em uma sala, com aquela roupa, todos param o que estão fazendo e dizem: "Sua bênção, Bispo!"

A terceira mãe, calmamente, acrescenta: - Pois o meu é cardeal. Quando entra em uma sala todos se levantam, beijam o seu anel e dizem: "Sua bênção, Eminência!"

A quarta mãe permanece quieta...

Então, a mãe do cardeal, só para provocar, pergunta:

- E o seu filho, não é religioso?

A quarta mãe responde:

- Meu filho tem 1,90 m , é bronzeado, com olhos verdes e pratica musculação. Quando entra numa sala, todo mundo olha e diz : Meeeeeeuuuuuuuu  Deeeuuuuusssssss!!!!!!




Publicado originalmente na Navetta*, enviado por fmvbrito em 2/3/2010

A orfandade política das ruas, por Carlos Castilho

O recado das ruas foi dado, mas como acontece em todo processo político, alguém terá que dar continuidade ao clamor por mudanças, expressado em cartazes, pichações, slogans e mensagens via redes sociais.

Mas, menos de três semanas depois da onda de manifestações de rua que sacudiu o país do Oiapoque ao Chuí, o que se vê são os políticos levando a temática da mudança para seus interesses eleitorais. Em vez de discutir como uma consulta popular contribuiria para uma mudança política no país, eles priorizam filigranas jurídicas e casuísmos como a dificuldade em adaptar a urna eletrônica para uma votação na base do “sim” ou “não”.

Por seu lado, a presidente da República está isolada no Palácio do Planalto porque sua comunicação com os manifestantes é feita exclusivamente pela mídia convencional, que está alinhada com os interesses eleitorais e obviamente enquadra as declarações de Dilma Rousseff dentro do seu projeto editorial. O programa de rádio da presidente tem traço de audiência.





A presidente teria a seu dispor a redes sociais para uma comunicação direta, mas isso a obrigaria a uma mudança radical de comportamentos e valores, porque inevitavelmente teria que enfrentar uma legião de desafetos, nem sempre cordiais. Uma alternativa seria a escolha de um interlocutor palaciano nas redes sociais, mas isso também exigiria um senhor jogo de cintura para lidar com o ambiente caótico do mundo político digital.

Neste quadro, fica patente a orfandade política dos milhares de pessoas, em sua maioria da classe média, que foram às ruas. Antes dos protestos, a ausência de canais de representação já existia e foi um dos principais motores das manifestações. Mas para os jovens com menos de 25 anos, a ida às ruas foi uma explosão de esperança, cunhada no grito “o gigante acordou” saído de muitas gargantas.

A esperança está cedendo lugar à frustração e os estudantes começam a se dar conta de que estão mais uma vez órfãos de representação política porque as emoções manifestadas nas ruas acabaram distorcidas pela mediocridade e corporativismo de deputados e senadores, com o apoio de governadores e prefeitos, de todos os partidos.

Esta situação pode criar as condições para o que meu colega Luciano Martins Costa chamou, neste Observatório, de segunda onda de protestos. O problema é que muitos participantes da primeira onda seguramente trarão muitos ressentimentos quando – e se – voltarem às ruas. A frustração por terem visto suas reivindicações distorcidas e manipuladas. O caso da reforma política é exemplar.

Os que foram às ruas em junho deixaram claro sua exigência de uma mudança nos comportamentos políticos, especialmente de deputados e senadores. Pois bem: Dilma Rousseff colocou a questão da reforma política na agenda oficial por meio da desajeitada proposta de plebiscito. Os membros do Congresso foram, no entanto, mudando o caráter da discussão e agora já se dá como quase certo de que no máximo se pode esperar mudanças cosméticas, caso a reforma acabe sendo decidida pela via parlamentar.

Preocupados apenas com as próximas eleições, os políticos e governantes estão brincando com fogo, pois alimentam a frustração não só dos jovens mas também de uma classe média cujo medo de perder conquistas sociais e econômicas é um elemento inédito da política brasileira. Historicamente, os protestos políticos no país sempre foram alimentados pelo sentimento de injustiça e opressão. Agora é diferente – e os tomadores de decisão parecem não ter entendido as consequências deste novo comportamento político.

Transcrito do Observatório da Imprensa, em 9/7/2013

Sobre o "Mais Médicos"

Governo socializa perdas e capitaliza lucros,  por João Bosco Rabello

Estadão

O pacote lançado ontem pela presidente Dilma Rousseff, com pompa e circunstância, como parte da solução para a saúde, carrega um aspecto recorrente nas ações de seu governo – o prato feito que contorna o debate prévio de tema de considerável teor polêmico.

Para uma medida que altera substancialmente as regras para a formação de médicos e sua atuação profissional no mercado, deveria ser precedido de ampla discussão.

Mal se sabia que o governo tinha na gaveta proposta que, por sua amplitude, não faz supor ter sido produzida da noite para o dia – e, se o foi, tanto pior. Tudo o que se sabia era a determinação do Executivo de importar médicos para suprir a escassez de profissionais da saúde no atendimento em áreas distantes e carentes do mais básico sistema de prevenção. A surpresa, porém, não ajuda, antes obstrui a boa tramitação da proposta.

Certamente, a ideia foi a de exibir capacidade de reação às cobranças claras da sociedade no setor, um dos mais complexos e ineficientes entre os classificados como serviços essenciais à população. Mas não só isso: ele reproduz a marca do governo que responde pelo isolamento em que a queda nas pesquisas submeteu a presidente Dilma – a decisão unilateral.

Partido tão caracterizado pelo debate interno, que exagera a ponto de dificultar ações objetivas, o PT é impositivo no governo, como demonstra a tentativa de democracia direta embutida na proposta do plebiscito. A proposta da saúde, sem consulta às instituições representativas dos médicos (de que se tenha notícia), revela que, além do Congresso, o governo evita também a discussão setorizada que possa representar risco às suas certezas.

Esse traço autoritário, comum em governos de esquerda (embora vendam o contrário), foi agravado pelos protestos de rua que levaram o Planalto a eleger culpados para uma crise que é, na essência, de gestão e, embora alcance as instâncias estaduais, faz sentir seu peso e desgaste mais sobre o governo federal. Não completamente sem razão, porque o atual governo completa uma década no poder.

A imagem que o governo passa hoje é a de um exército entrincheirado no Planalto Central, disparando artilharia pesada contra tudo e todos que julga potenciais obstáculos ao que o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), definiu adequadamente como “nosso projeto”.  O fez o candidato petista à sucessão de Rui Falcão na presidência do partido, como alerta à base aliada para o grau de altíssimo risco em que entrou o plano de permanência no poder.

Mas como o pronome possessivo indica, “nosso projeto” é o do PT, posto que nenhum parceiro do governo dele se considera parte, o que transforma o apelo do deputado pela unidade da base numa revelação de temor exclusiva de seu partido. O PMDB, para ficar no aliado mais expressivo, saboreia a crise do parceiro.

O pacote anunciado ontem tem até seus méritos. Não responde em curto prazo aos clamores por melhores serviços, mas exibe um lado objetivo de ataque a uma das causas, buscando a qualificação da formação do profissional médico. Mas ao custo de ampliar em dois anos a obtenção de um diploma que já custa hoje seis anos de investimento ao estudante de medicina.

Também pode ser positiva a obrigatoriedade da prestação de serviços no SUS, mas não haveria outro modo de estabelecê-la por um prazo menor? Essa é uma indagação que já se encontra nas edições de hoje dos jornais que repercutem as medidas junto aos especialistas, ou seja, os médicos. Num debate prévio, que o Congresso promoverá, certamente, ela será repetida, entre muitas outras.

Corre o risco o governo de o Congresso ocupar o espaço desse debate com a classe médica, aprimorando o projeto e capitalizando politicamente seus efeitos.  Trazendo para seu lado os representantes da categoria desconsiderados pelo Planalto.

Se fosse uma medida que dispensasse a ação congressual, outra certeza estaria lançada: a de que o projeto acabaria judicializado.O Planalto distribui o ônus da crise e tenta capitalizar sozinho as soluções, estratégia que tem tudo para dar errado. Ou, como se diz no jargão político, não corre o risco de dar certo.


Transcrito do Estadão.com.br de 9/7/2013

Olá! Bom Dia!

                                                   
                                           Brasileirinho, com Dominguinho