segunda-feira, 8 de julho de 2013

Palavrinha

Um menino levado e muito querido, que morreu precocemente, um dia, ao ser repreendido pela mãe por não se espelhar no irmão mais velho, sempre primeiro aluno da classe, respondeu: "Mãe, filho não é igual tijolo que sai tudo igual da olaria".

Pois é o comentário que faço ao ouvir que Graciliano Ramos, por ter um temperamento seco e calado, pouco afeito a expansões, não era romântico. Já ouvi até uma senhora dizer, após ler "São Bernardo", que ele não entendia nada de amor.

Papagaio! Será que todos temos que amar e expressar nosso amor do mesmo jeito? Tudo tijolinho?

Mas esse detalhe, romântico ou não, é mesmo só um detalhe. Que interessa à família.

Para nós, os felizardos herdeiros das palavras de Graciliano em todos os seus livros, todos, o que interessa é sentir o grande amor que ele tinha ao Brasil. Como sofria por nossa terra e seus moradores. Ler um livro dele e lá pelas tantas não chorar é, para mim, tarefa impossível.

Interessa também pensar, depois de ler os dois célebres relatórios que como prefeito de Palmeiras dos Índios ele enviou ao governador de seu estado, Alagoas: imagine um Ministério formado por 12 Gracilianos! O Brasil seria uma potência e seu povo o mais feliz da face da Terra.

Copiei um pequenino trecho de seu primeiro relatório; sugiro que leiam:

  • "ADMINISTRAÇÃO
    A administração municipal absorveu 11:457$497 – vencimentos do Prefeito, de dois secretários (um efetivo, outro aposentado), de dois fiscais, de um servente; impressão de recibos, publicações, assinatura de jornais, livros, objetos necessários à secretaria, telegramas.

    Relativamente à quantia orçada, os telegramas custaram pouco. De ordinário vai para eles dinheiro considerável. Não há vereda aberta pelos matutos, forçados pelos inspetores, que prefeitura do interior não ponha no arame, proclamando que a coisa foi feita por ela; comunicam-se as datas históricas ao Governo do Estado, que não precisa disso; todos os acontecimentos políticos são badalados. Porque se derrubou a Bastilha – um telegrama; porque se deitou uma pedra na rua – um telegrama; porque o deputado F. esticou a canela – um telegrama. Dispêndio inútil. Toda a gente sabe que isto por aqui vai bem, que o deputado morreu, que nós choramos e que em 1559 D. Pero Sardinha foi comido pelos caetés.


    Palmeira dos Índios, 10 de janeiro de 1929.
    Graciliano Ramos"

Dá para acreditar que 85 anos depois Alagoas nos tenha dado um presidente do Senado que se acha no direito de usar a Força Aérea Brasileira como se sua fosse?

Não sei dizer se faz bem ou mal ler os relatórios que o prefeito GR enviou. Mas na esperança que atraiam bons fluidos, aí vão:

Revista de História:

Relatório da Prefeitura Municipal de Palmeira dos Índios, 1929

Relatório da Prefeitura Municipal de Palmeira dos Índios, 1930


Com fé que ajudem, MH

2 comentários:

  1. CLAP! CLAP! CLAP!

    Devidamente usurpado para o Bloghettinho. Ahá.

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  2. "Toda a gente sabe que isto por aqui vai bem, que o deputado morreu, que nós choramos e que em 1559 D. Pero Sardinha foi comido pelos caetés" é maravilhoso, não é não, Selminha? O cara era bom. Sabia escrever e, mais que tudo, sabia pensar! Os dois relatórios são sensacionais! bj,
    MH

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