sábado, 8 de junho de 2013

Sanforizados?

Tenho a impressão que os brasileiros foram submetidos a um processo de sanforização.

Só os mais velhos, como eu, sabem o que vem a ser ‘sanforizado’. Explico: era o nome dado a um processo industrial que impedia o tecido de fibra natural de encolher ou alargar depois de lavado.

Roupas sanforizadas eram mais caras, porém, em compensação, a vantagem era enorme. Pagar caro por uma camisa e vê-la diminuir de tamanho após a primeira lavagem... não era lá muito simpático.

Nós estamos assim. Nossas opiniões são sanforizadas, i.e, estratificadas, palavra mais adequada a algo abstrato. E o pior é que nem sempre somos nós que as estratificamos. Muitas vezes, são os outros.  E opinião inalterada, nunca, jamais, francamente, é ideia fixa.

Ao ler comentários que os leitores deixaram no depoimento de Dulce Pandolfi, eu me assustei. Não acredito, e não acredito mesmo, que a grande maioria acredite no que escreveu. Mas como um dia disseram que os guerrilheiros eram mentirosos, não podem, nem diante de um depoimento como o citado, que transborda emoção, que perpassa a dor e o sofrimento da vítima, admitir que sua opinião possa ter sido precipitada: nem todos os casos são iguais.

Além do detalhe que parece ter sido ignorado, mas que é a espinha dorsal do Horror: a moça estava sob a guarda do Exército, sob a guarda do Estado.  E o Estado tem a obrigação sagrada de zelar pelos que lhe são entregues. Por não levar em conta esse dado é que toleramos cadeias como as nossas. Seja qual for o crime, do mais abjeto ao mais irrelevante, sob a guarda do Estado o preso tem que ser respeitado. O Estado não pode estuprar os direitos do Homem, nunca. O Estado tem que ser melhor, mais elevado, mais honrado, mais ético, sempre.




Nas voltas que o pensamento da gente dá, chego à sabatina do novo ministro do STF, cujas respostas apreciei.

Diante da quase obrigação de ‘uma vez a Cascais, nunca mais’, quer dizer, se eu disser que gostei da resposta tal, nunca mais posso discordar... talvez fosse prudente calar. Mas como a prudência nem sempre é qualidade, às vezes é só tolice...

Gostei de saber que o ministro acha que obrigar a gestante a levar a termo uma gravidez cujo fruto não viverá é sofrimento a ser evitado; também de saber que ele é favorável a que o MP conduza uma investigação por exceção e, em certos caos, até por dever; fiquei entusiasmada ao ver que ele acha que a liberdade de expressão deve ser ampla, mas com “limites”, não é sair por aí dizendo tudo que quer sobre quem quiser.
    
O que me impressionou mal: não acredito em imunidade total à influência da vida à nossa volta. Acho mesmo impossível, a não ser que passe a viver numa redoma.

Quanto ao mensalão e a seu mais do que aguardado desfecho, lembro a mim mesma que no STF são onze as cabeças que vão confirmar se o ponto esteve ou não fora da curva. E nenhuma delas, que eu saiba, foi sanforizada.


por Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa
Publicado originalmente no Blog do Noblat em 7/6/2013

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